A Via Varejo, dona
das Casas Bahia e do Ponto Frio, fechou acordo com
o Ministério Público do Trabalho (MPT) para pagar R$ 4,5 milhões por
duas ações civis públicas de assédio moral contra funcionários de lojas da
Casas Bahia. Os casos aconteceram em diversas lojas do interior de São Paulo e
levaram a empresa a ser condenada em primeira e segunda instância.
As ações são de 2010 e
2016 e foram movidas pelo MPT a partir de relatos dos funcionários e de
denúncias dos sindicatos. Em uma das ações, que se refere ao centro de
distribuição de Jundiaí, houve demissões de funcionários que participaram do
movimento grevista em agosto de 2008, incluindo membros da CIPA, que não
poderiam ser dispensados.
A outra ação reúne
diversas denúncias de assédio moral em lojas do interior de São Paulo, muitas
em decorrência do descumprimento das metas de venda. Em Presidente Prudente, o
funcionário que não atingisse a meta era submetido a constrangimentos, sendo
obrigado a imitar animais ou dançar na frente de todos, durante as reuniões.
Em São João da Boa Vista,
os funcionários eram obrigados a fazer venda “casada” de garantia, com
explícita orientação de enganar o cliente. A imposição se apoiava em
comunicados da coordenação regional de vendas aos gerentes.
Caso semelhante também
ocorreu na loja de Sorocaba, onde, além da venda casada, a venda chamada
"boca do caixa" – sem pagamento de comissão ao vendedor – era usada
como meio de punição dos trabalhadores.
O juiz Marcelo Chaim
Chohfi afirma em uma das sentenças que as ações individuais eram cômodas e
lucrativas para empresa. “Constranger empregados para o cumprimento de metas e,
também, impor-lhes a obrigação de enganar clientes através da chamada ‘venda casada’,
certamente traz benefícios econômicos à reclamada.”
O advogado e professor de
direito Welington Arruda afirma que os empregados foram usados para a obtenção
de benefícios econômicos e comerciais cada vez maiores, por meio de práticas de
assédio e ilegalidades de ordem coletiva. “Importa salientar que a decisão,
apesar de possuir viés trabalhista, demonstra inegável crime contra o
consumidor, quando deixa clara a sede de vender a qualquer custo produtos
casados, sendo, muitas vezes, praticamente, uma obrigatoriedade, o que é vedado
pelo Código de Defesa do Consumidor”, afirmou.
Acordo
O acordo, firmado com o
Ministério Público do Trabalho no dia 15 de abril prevê, além da indenização
trabalhista, uma série de obrigações que a Via Varejo deve cumprir. Entre elas
está o comprometimento de não praticar nenhum ato de assédio moral, de
assegurar um ambiente de trabalho digno e respeitoso aos funcionários e de
manter, permanentemente, mecanismos como ouvidoria.
A empresa também deverá
oferecer aos empregados cursos sobre assédio moral, discriminação e coação no
trabalho, com enfoque na saúde física e mental do trabalhador. Em caso de
descumprimento dessas obrigações, a empresa deverá pagar multa de R$ 50 mil por
cláusula, com um teto anual de R$ 1,2 milhão.
A indenização de R$ 4,5
milhões teve a primeira das 12 parcelas paga no mês passado. O valor será
destinado a projetos de finalidade social ou a entidades privadas. A
procuradora regional do trabalho Adriana Bezerra, que participou da formulação
do acordo, afirma que, sem dúvida, o resultado foi interessante, já que, apesar
de duas condenações, não havia trânsito julgado.
Ela explica que o valor
não será revertido aos trabalhadores, mas à sociedade. “Nós formamos um grupo
de trabalho no Ministério Público para estudar qual será a destinação desse
valor”, afirmou. “A intenção é que ele seja o mais abrangente possível e o mais
benéfico possível para a sociedade local, para a região do local do dano.”
A advogada trabalhista e
sindical Cristina Buchignani explica que é comum o valor de acordos e multas em
processos dessa natureza ir para ações educativas. “Reverter ao funcionário não
teria uma expressividade no âmbito coletivo, que é o que se tenta proteger. O
objetivo é eliminar o assédio e ações de constrangimento no ambiente de
trabalho como um todo, e não pontualmente. Esse é o objetivo”, afirmou. “É
fazer algo que possa educar e preparar as pessoas para que isso não aconteça
mais. Foi um acordo positivo.”
Em nota, a Via Varejo
afirmou que “repudia qualquer ato que viole seu Código de Conduta Ética,
documento que visa garantir um ambiente de trabalho harmonioso e livre de
qualquer situação desrespeitosa”. Sobre o acordo celebrado, a empresa disse que
”se tratam de casos antigos, que ocorreram há quase 10 anos, e reforça
que tem como principal objetivo regularizar tais práticas anteriores,
enfatizando o compromisso com os valores da Companhia”.
Fonte:
Estado de S.Paulo